por Robinson Cavalcanti
Em minha recente visita aos Estados Unidos, vou de Amesbury para Boston em companhia de um dos Bispos da Igreja Episcopal Reformada (REC), ora em processo de integração à Igreja Anglicana na América do Norte (ACNA). Conversa vai, conversa vem, pedi que me esclarecesse um intrigante fato histórico: como foi que a então Igreja Protestante Episcopal nos Estados Unidos da América (PCUSA, depois ECUSA, hoje TEC), tendo uma absoluta maioria e hegemonia evangélica em torno de 1850, em 1990 tinha a presença evangélica praticamente desaparecido, restando algumas raríssimas e isoladas ilhas eclesiásticas remanescentes.
O Bispo me falou do impacto do Movimento de Oxford (anglo-catolicismo), iniciado na década de 1830, na Inglaterra, como revitalização da antiga Igreja Alta (“high and dry”), e que a fundação da REC tinha sido uma reação à sua avassaladora presença e influência nos Estados Unidos. Em um primeiro momento, um terço da PCUSA foi para REC, mas a maioria recuou satisfeita com a redação do “Quadrilátero de Chicago” (depois “Quadrilátero de Lambeth”): Escrituras, Credos, Sacramentos, Episcopados. A REC, depois de uma fase missionária, se fecha e passa por um longo período de estagnação.
Mas, e a PCUSA? Aí é que está o nó da questão: enquanto os evangélicos se dedicavam a abrir frentes missionárias, a evangelizar e criar obras sociais, não comparecendo aos Concílios e Sínodos, desinteressados e desvalorizando a instituição, os anglo-católicos iam ocupando as reitorias e as cátedras dos seminários, as presidências de juntas e comissões, e, por fim, o episcopado da maioria das Dioceses. Em apenas uma geração tomaram o poder e mudaram a cara da Igreja e o curso da história.
Outro fato semelhante vai ocorrer um século depois, a partir da década de 1960. Naquela época os evangélicos estavam se reorganizando, com a fundação da “Fundação Barnabé”, ligada a Fraternidade Evangélica da Comunhão Anglicana (EFAC) liderada por John Stott, tinha criado o Seminário Trinity, e já contavam com 5% dos episcopais norte-americanos; os anglo-católicos tinham também criado o seu seminário, o Nashota House, e, o Movimento Carismático ia deslanchar e conhecer o seu apogeu. Além de limitados contatos internacionais, e de falta de unidade entre essas três vertentes ortodoxas, outra vez, o institucional é desvalorizado: os anglo-católicos se contentavam com suas velas e incensos, os evangélicos com suas missões e os carismáticos com as suas aleluias. Aí os liberais-católicos fazem o mesmo movimento de ocupação institucional que os anglo-católicos haviam feito no século XIX. Entre 1960 e 1990 eles desbancam os anglo-católicos e ocupam o poder da então ECUSA.
Isso me faz lembrar o pensador leigo ortodoxo russo Nicolau Bediaeff, quando dizia que todas as revoluções malignas contemporâneas vieram como resultado da inação dos cristãos quando tinham oportunidade. Isso sem falar dos cristãos evangélicos e o apoio ao nazismo, ao racismo dos EUA e ao regime do apartheid na África do Sul.
O buraco está mais embaixo. Assim como sofremos com a dicotomia alma (boa) vs. corpo (mau) de origem platônica, temos a equivalência entre organismo (bom) vs. organização (má) na vida em sociedade, como se fosse possível uma vida sem instituições: família, trabalho, Estado, etc., que não é “má”, mas reflete as ambiguidades morais da natureza humana caída e a maior ou menor presença do “sal da terra e luz do mundo”.
Não se pode brincar de filiação institucional, com um vínculo tênue e mínimo nesse “mal necessário”, e depois se reclamar que os hereges ocuparam os cargos de mando. Os hereges não tomam o poder eclesiástico; os ortodoxos, por equívoco ou preguiça é que o entregam de mão beijada. Depois vão rachando, e criando instituições “puras” (até a próxima impureza), ou, o que vemos hoje, geram o absolutismo da “igreja sou eu” do caudilhismo eclesiástico de vários matizes.
Se não aprendermos com os erros da História – afirmou um pensador – somos condenados a repeti-la.
O problema passa por uma grave distorção eclesiológica. Mas, isso já seria assunto para outro texto...
Em minha recente visita aos Estados Unidos, vou de Amesbury para Boston em companhia de um dos Bispos da Igreja Episcopal Reformada (REC), ora em processo de integração à Igreja Anglicana na América do Norte (ACNA). Conversa vai, conversa vem, pedi que me esclarecesse um intrigante fato histórico: como foi que a então Igreja Protestante Episcopal nos Estados Unidos da América (PCUSA, depois ECUSA, hoje TEC), tendo uma absoluta maioria e hegemonia evangélica em torno de 1850, em 1990 tinha a presença evangélica praticamente desaparecido, restando algumas raríssimas e isoladas ilhas eclesiásticas remanescentes.
O Bispo me falou do impacto do Movimento de Oxford (anglo-catolicismo), iniciado na década de 1830, na Inglaterra, como revitalização da antiga Igreja Alta (“high and dry”), e que a fundação da REC tinha sido uma reação à sua avassaladora presença e influência nos Estados Unidos. Em um primeiro momento, um terço da PCUSA foi para REC, mas a maioria recuou satisfeita com a redação do “Quadrilátero de Chicago” (depois “Quadrilátero de Lambeth”): Escrituras, Credos, Sacramentos, Episcopados. A REC, depois de uma fase missionária, se fecha e passa por um longo período de estagnação.
Mas, e a PCUSA? Aí é que está o nó da questão: enquanto os evangélicos se dedicavam a abrir frentes missionárias, a evangelizar e criar obras sociais, não comparecendo aos Concílios e Sínodos, desinteressados e desvalorizando a instituição, os anglo-católicos iam ocupando as reitorias e as cátedras dos seminários, as presidências de juntas e comissões, e, por fim, o episcopado da maioria das Dioceses. Em apenas uma geração tomaram o poder e mudaram a cara da Igreja e o curso da história.
Outro fato semelhante vai ocorrer um século depois, a partir da década de 1960. Naquela época os evangélicos estavam se reorganizando, com a fundação da “Fundação Barnabé”, ligada a Fraternidade Evangélica da Comunhão Anglicana (EFAC) liderada por John Stott, tinha criado o Seminário Trinity, e já contavam com 5% dos episcopais norte-americanos; os anglo-católicos tinham também criado o seu seminário, o Nashota House, e, o Movimento Carismático ia deslanchar e conhecer o seu apogeu. Além de limitados contatos internacionais, e de falta de unidade entre essas três vertentes ortodoxas, outra vez, o institucional é desvalorizado: os anglo-católicos se contentavam com suas velas e incensos, os evangélicos com suas missões e os carismáticos com as suas aleluias. Aí os liberais-católicos fazem o mesmo movimento de ocupação institucional que os anglo-católicos haviam feito no século XIX. Entre 1960 e 1990 eles desbancam os anglo-católicos e ocupam o poder da então ECUSA.
Isso me faz lembrar o pensador leigo ortodoxo russo Nicolau Bediaeff, quando dizia que todas as revoluções malignas contemporâneas vieram como resultado da inação dos cristãos quando tinham oportunidade. Isso sem falar dos cristãos evangélicos e o apoio ao nazismo, ao racismo dos EUA e ao regime do apartheid na África do Sul.
O buraco está mais embaixo. Assim como sofremos com a dicotomia alma (boa) vs. corpo (mau) de origem platônica, temos a equivalência entre organismo (bom) vs. organização (má) na vida em sociedade, como se fosse possível uma vida sem instituições: família, trabalho, Estado, etc., que não é “má”, mas reflete as ambiguidades morais da natureza humana caída e a maior ou menor presença do “sal da terra e luz do mundo”.
Não se pode brincar de filiação institucional, com um vínculo tênue e mínimo nesse “mal necessário”, e depois se reclamar que os hereges ocuparam os cargos de mando. Os hereges não tomam o poder eclesiástico; os ortodoxos, por equívoco ou preguiça é que o entregam de mão beijada. Depois vão rachando, e criando instituições “puras” (até a próxima impureza), ou, o que vemos hoje, geram o absolutismo da “igreja sou eu” do caudilhismo eclesiástico de vários matizes.
Se não aprendermos com os erros da História – afirmou um pensador – somos condenados a repeti-la.
O problema passa por uma grave distorção eclesiológica. Mas, isso já seria assunto para outro texto...
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