Michael S. Horton
Cícero observou em sua cultura que as pessoas agradeciam a Deus por sua prosperidade material, mas nunca pelas suas virtudes, pois consideram isso como uma característica inerente a elas mesmas. B. B. Warfield, um teólogo da cidade de Princeton, considerou o Pelagianismo “a reabilitação da visão pagã do mundo”, e concluiu com grande clareza: “Há duas doutrinas fundamentais sobre salvação: a que ensina que a salvação vem de Deus, e que ensina que a salvação é vinda de nós mesmos. A primeira é a doutrina fundamental do Cristianismo; a última, do paganismo universal”.
As ferinas críticas de Warfield fazem coro com o testemunho da igreja desde que Pelágio e seus discípulos começaram a patrocinar sua heresia. São Jerônimo, um Latino que viveu no quarto século, chamou o Pelagianismo de “a heresia de Pitágoras e Zeno”, por ser no paganismo que se tem normalmente a convicção de que os seres humanos têm dentro de si o poder de salvar-se a si próprios. O que, então, foi o Pelagianismo, e qual a sua origem?
Primeiramente, essa heresia originou-se com os nossos primeiros pais, como veremos adiante. Ela foi definida e classificada no quinto século, quando Pelágio, um monge britânico, chegou à cidade de Roma. Desde o momento em que lá chegou, Pelágio ficou profundamente impressionado com a imoralidade do ambiente, e decidiu começar uma reforma moralista nos sacerdotes romanos. Apesar de ter exigido um grande esforço, essa campanha encontrou apoio por parte de muitas pessoas. O sustentáculo de sua pregação era a ênfase que havia no influente bispo africano, Santo Agostinho.
Agostinho ensinava que os seres humanos, por nascerem com o pecado original, são incapazes de salvar-se a si mesmos. Segundo ele, fora da graça de Deus, é impossível que uma pessoa obedeça ou até mesmo busque a Deus. Com o pecado de Adão, houve uma total corrupção na raça humana, de modo que a vontade natural do homem está fatalmente cativa e submissa à nossa condição pecaminosa. Dessa forma, somente a graça de Deus, concedida livremente aos Seus eleitos, é capaz de trazer salvação aos seres humanos.
Contrastando em muito a isso, o discurso de Pelágio era guiado por interesses morais, e sua teologia foi feita para estimular o aprimoramento moral e social. Ele concluiu de forma fatalista que a ênfase de Agostinho na necessidade humana e na graça divina iria certamente paralisar a busca da santificação, visto que as pessoas iriam passar a pecar constante e impunemente. Dessa forma, Pelágio reagiu rejeitando a doutrina do pecado original. De acordo com ele, Adão foi meramente um mal exemplo, e não o autor de nossa natureza pecaminosa – somos pecadores porque temos pecados – e não o contrário. Conseqüentemente, é claro, o Segundo Adão, Jesus Cristo, foi apenas um bom exemplo. A salvação, dessa forma, consiste simplesmente em seguir o exemplo de Jesus em vez do de Adão. O que os homens e mulheres precisam é de uma direção moral, não de um novo nascimento; assim sendo, Pelágio viu a salvação em termos meramente naturais: seria o progresso do caráter humano, por seguir o exemplo de Cristo.
Em seu comentário em Romanos, Pelágio acredita na graça como a revelação de Deus no Velho e Novo Testamentos, a qual nos ilumina, e auxilia nossa santidade por providenciar instruções explícitas sobre Deus, e por dar muitos exemplos a serem imitados. O homem natural não é concebido em pecado. Conseqüentemente, a vontade humana não está presa a uma natureza pecaminosa e suas afeições; apenas as escolhas determinam se alguém irá obedecer a Deus, e assim ser salvo.
Em 411, surge um homem, Paulinho de Milão, com uma lista de seis pontos heréticos contidos na mensagem de Pelágio.
1. Adão foi criado mortal e teria morrido se mesmo que não tivesse cometido pecado;
2. O pecado de Adão agrediu somente a ele, não toda a raça humana;
3. Crianças recém-nascidas estão no mesmo estado que Adão antes da sua queda;
4. Não é por causa da morte e do pecado de Adão que toda a raça humana morre; de igual modo, ela não irá ressuscitar por causa da ressurreição de Cristo;
5. A lei oferece, assim como o evangelho, oferece entrada no Reino do Céu;
6. Até mesmo antes da vinda de Cristo, havia homens completamente sem pecado.
Mais tarde, Pelágio e seus seguidores negaram a doutrina da predestinação incondicional.
É obvio que o Pelagianismo foi condenado por mais concílios da Igreja do que qualquer outra heresia na história. Em 412, Coelestius, um discípulo de Pelágio, foi excomungado no Sínodo de Cartago; os Concílios de Cartago e Milevis condenaram Pelágio. O imperador oriental Teodósio II baniu os Pelagianos do Leste, em 430 d.C. A heresia foi repetidamente condenada pelo Concílio de Éfeso, em 431, e pelo Segundo Concílio de Orange, em 529. De fato, o Concílio de Orange condenou até mesmo o Semi-Pelagianismo, que embora afirme que a graça é necessária à salvação, ensina que a vontade é livre por natureza para escolher cooperar com a graça oferecida. O Concílio de Orange condenou também aqueles que ensinavam que a Salvação poderia ser concedida no simples ato de se fazer uma oração, afirmando em lugar disso, com muitíssimas referências bíblicas, ser necessário Deus despertar o pecador e lhe conceder o dom da fé antes que ele possa até mesmo buscá-lO.
Qualquer doutrina que limita o conhecimento do pecado original, o cativeiro da vontade à natureza pecaminosa, e a necessidade da graça para até mesmo aceitar dom da vida eterna e permanecer em santidade é considerada por toda a igreja como heresia. A heresia descrita é chamada Pelagianismo.
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