Ricardo Barbosa de Souza
Há um versículo na Bíblia que tem orientado a minha vida de oração. Na verdade, são muitos os versículos e passagens da Bíblia que me orientam, mas este, em particular, tem sido uma fonte inesgotável de meditação ou de motivação para minha experiência com a graça de Deus. É um versículo que procuro ter em mente todas as vezes que oro. Talvez, por sua profundidade teológica, ele sempre se apresente com formas e conteúdos desafiadores que me levam a considerar realidades e promessas ainda não exploradas. Bem, o versículo é a afirmação (e pergunta) do apóstolo Paulo, que diz: “Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura, não nos dará graciosamente com ele todas as coisas?”
Para mim, Paulo traz a nós uma das mais extraordinárias revelações sobre o Evangelho da graça de Jesus. Somente alguém que mergulhou nas águas profundas do significado da cruz, na natureza do sofrimento e morte de Cristo, é que pode ter um discernimento como este. Por que este versículo me inspira tanto em minha vida de oração? Penso que um dos motivos é que sempre achei, e ainda acho, que preciso batalhar para ter o que preciso. Aprendi que nada cai do céu; tudo é conquistado com trabalho, dedicação, disciplina e perseverança – enfim, temos aquilo que merecemos ter.
Talvez, por ter sido criado assim, cresci com uma sensação de que não deveria esperar certas coisas de Deus; não deveria sequer expressá-las em oração. Não as merecia, achava-me indigno. Era como se alguma parte da ação divina dependesse do meu esforço e empenho, mas como nunca me considerei esforçado o suficiente para as demandas de Deus, não poderia também esperar dele algo maior. No entanto, Paulo me apresenta esta preciosidade. Se Deus me deu, sem que eu merecesse, seu Filho amado, assim o fez apenas porque me amava, importava-se comigo. Teve compaixão do meu estado, quis ver-me salvo, redimido da condenação, do pecado, da morte eterna. Deus o entregou para sofrer a minha pena e beber o cálice amargo do meu pecado, e fez tudo isto graciosamente, sem exigir nada em troca, nenhum esforço. Se ele não poupou seu próprio Filho, antes, o entregou por mim e por você; se a cruz nos revela que o amor de Deus é de tal natureza que o levou a nos oferecer o que tinha de mais precioso, o bem maior, seu próprio Filho, Paulo então, levanta a pergunta: “Porventura, não nos dará graciosamente com ele todas as coisas?”
A oração é o lugar onde os nossos desejos mais íntimos são apresentados. Não, necessariamente, para serem atendidos irresponsavelmente, como quem atende os desejos voluntariosos de uma criança mimada, mas para serem transformados, reordenados e, por fim redimidos. É possível que, por não termos nossos desejos mais íntimos atendidos, relutemos em apresentá-los na oração. No entanto, Deus se preocupa conosco, com nossas necessidades mais pessoais, com nossos desejos secretos, e é isto que Paulo nos revela neste precioso versículo.
Este é o espírito com que devemos nos aproximar junto do trono da graça. É o amor revelado na cruz que motiva a nossa oração.
Deus, diante de quem nos prostramos, não é mesquinho, não nega bem algum aos seus filhos, não rejeita nenhuma de nossas orações. Seu interesse e amor por nós tem sido revelado desde a criação e manifestou-se de forma gloriosa e definitiva no Calvário. Ele sempre se empenhou por nós e por nossa redenção; fez tudo o que era necessário para nos libertar da culpa e condenação do pecado, olhou para mim e para você de forma única e singular. Contemplou-nos em nossa miséria, veio a nós com graça salvadora e nos deu seu Filho. Tendo feito tudo isto, o que poderia nos negar? Haveria alguma coisa que nos fosse necessária à salvação, ao cumprimento dos propósitos de Deus, à vida santificada, que ele nos negaria? Alguma bênção? Algum favor? Algum milagre? Se ele não nos negou seu Filho, nos negaria o quê?
Tenho orado por muitas coisas que não aconteceram. Tenho suplicado por milagres que não vi. Tenho intercedido por situações que não mudaram. No entanto, nada disto muda a convicção que esta afirmação de Paulo me dá. George McDonald está correto quando afirma: “As minhas orações fluem daquilo que eu não sou, mas as respostas de Deus fazem de mim o que de fato devo ser”. Minhas orações e desejos brotam dos meus medos, inseguranças, rejeição, mas as respostas de Deus me transformam e fazem de mim uma pessoa mais verdadeira e ordena os meus desejos confusos. Deus, ao me dar o seu unigênito Filho, tem me dado, graciosamente, junto com ele, todas as outras coisas.
Esta afirmação de Paulo me ajuda a viver pela fé e também a compreender o que ele diz quando afirma: “Todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus.” Ou seja, todas as coisas fazem parte da resposta de Deus às nossas orações e nos conduzem pelos caminhos verdadeiros, mesmo quando não desejamos andar por eles. Vivo entre o “já” e o “ainda não”, entre a consciência de um Deus eterno, bom, misericordioso, justo e santo e uma vida limitada, temporal, confusa, injusta e marcada pelo pecado. Carrego comigo desejos celestes e mundanos; busco a santidade, mas ainda o pecado me rodeia e me faz tropeçar; quero amar mas resisto ao amor. Entre o “já” e o “ainda não”, entre a vida que vivo hoje e a vida gloriosa que um dia receberei do meu Senhor, minhas orações continuarão sofrendo as mesmas lutas que eu sofro. Porém, com esta revelação com que Paulo me presenteia, posso seguir orando, clamando e suplicando, certo de que Deus, em sua enorme misericórdia, por causa do grande amor com que me tem amado em seu Filho Jesus Cristo, me dará sempre, graciosamente, junto com seu Filho amado, todas as coisas que me forem necessárias.
Se aqui no mundo precisamos nos esforçar e batalhar para termos o que precisamos; diante de Deus, a batalha, o esforço, o empenho foi feito pelo Filho eterno que, por causa de seu amor, deu-se por nós e, juntamente com a dádiva de sua vida, nos deu também de graça todas as outras coisas. Agora dá para compreender porque Jesus, ao ensinar seus discípulos a orar, disse: “Vosso Pai sabe do que necessitais antes que lho peçais.” Como é bom orar sabendo destas coisas.
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