quinta-feira, 16 de julho de 2009

Conforto na hora da tentação (Mateus 4)...

por John Knox (1503-1572†)

A causa que me moveu a tratar desta passagem das Escrituras foi para que aqueles que, pela inescrutável providência de Deus, caem em diversas tentações, não se julguem, por causa disso, menos aceitáveis na presença de Deus; mas, pelo contrário, tendo o caminho preparado para vitória através de Cristo Jesus, não temam, acima da medida, as astutas investidas da ardilosa serpente, Satanás; mas, com alegria e coragem, tendo tal Guia, tal Campeão e tais armas, como as encontradas nesta passagem (se com obediência ouvirmos e crermos verdadeiramente), possam assegurar-se do presente favor de Deus e da vitória final, por meio de Cristo, que, para nossa segurança e livramento, entrou na batalha e triunfou sobre seu adversário e sobre toda sua fúria, e também, para que as subseqüências, sendo ouvidas e entendidas, possam ser melhor guardadas na memória.

O propósito pelo qual o Espírito Santo conduziu Jesus ao deserto para que Jesus fosse tentado, é nos fazer entender, através deste fato, que Satanás nunca cessa de se opor aos filhos de Deus, mas continuamente, por um meio ou outro, os conduz e os provoca a algum juízo pecaminoso sobre o Deus deles.

Desejar que pedras se transformem em pães ou que a fome seja satisfeita, nunca foi pecado, nem tão pouco uma opinião pecaminosa sobre Deus, mas, creio que esta tentação foi mais espiritual, mais sutil e mais perigosa. Satanás estava se referindo a voz de Deus que disse ser Cristo Seu Filho Amado.

Contra esta declaração ele luta, como lhe é intrínseco fazer, contra a indubitável e imutável palavra de Deus; pois sua malícia contra Deus e seus filhos escolhidos é tal, que para quem Deus declara amor e misericórdia, a estes ele ameaça com desprazeres e maldições; e onde Deus ameaça morte, lá ele é audacioso em declarar vida. Por causa disto Satanás é chamado de mentiroso desde o princípio (João 8:44).

Assim sendo, o objetivo de Satanás é levar Cristo à desesperança, para que Ele não creia na voz de Deus seu Pai; e este parece ser o significado desta tentação: “Tu ouviste”, Satanás diria, “uma voz dos céus dizer que Tu eras o amado Filho de Deus, no qual Ele se compraz (Mateus 3:17), mas não te julgarão louco ou um tolo sem juízo, se creres em tal promessa? Onde estão os sinais deste amor? Tu não estás sem o conforto de todas as criaturas? Tu estás pior do que as brutas feras, pois todo dia elas caçam para se alimentar e a terra produz grama e ervas para seu sustento, de forma que nenhuma delas definha ou é consumida pela fome. Mas tu jejuas há quarenta dias e quarenta noites, esperando sempre algum alívio e conforto dos céus, mas tua melhor provisão são pedras duras! Se Te glorias em teu Deus, e crês verdadeiramente na promessa que foi feita, ordena que estas pedras se transformem em pães. Mas, é evidente que Tu não o podes fazer, pois se pudesses, ou se teu Deus tivesse Te concedido tal privilégio, há muito terias matado tua fome e não necessitarias suportar este abatimento por falta de comida. Mas vendo que ainda continuas assim e que nenhum mantimento foi preparado para Ti, é presunção acreditar em tal promessa, e por isso, perca a esperança de qualquer socorro das mãos de Deus e proveja para Ti, por qualquer outro meio!”

Mas aqui devemos notar a base e o fundamento desta tentação. A conclusão de Satanás é esta: “Tu não és um eleito de Deus, muito menos seu Filho amado”. Sua razão é esta: “Tu estás em dificuldades e não achas alívio”. Logo, o fundamento da tentação era a pobreza de Cristo e a falta de comida, sem esperança de receber, da parte de Deus, o remédio. É a mesma tentação com a qual o diabo objetou a Cristo por meio dos principais sacerdotes, quando em seu tormento atroz na cruz; eles gritavam: “Se Ele é Filho de Deus, deixe que desça da cruz e creremos nele. Confiou em Deus; pois venha livrá-lO agora, se de fato Lhe quer bem” (Mt. 27:40,43). Como se dissessem: “Deus liberta os seus servos dos problemas. Ele nunca permite que os que O temem sejam envergonhados. Mas vemos este homem em angústia extrema. Se Ele é o Filho de Deus, ou ainda um verdadeiro adorador do Seu nome, Deus o livrará desta calamidade. Se não livrá-lO, mas permitir que pereça nesta angústia, então é um sinal seguro de que Deus O rejeitou, como hipócrita, que não terá porção de sua glória”. Assim, Satanás tem oportunidade para tentar e também para mover outros a julgar e condenar os eleitos de Deus e seus filhos escolhidos, em função de que lhes sobrevêm muitas angústias.

A principal astúcia de Satanás é atormentar aqueles que começaram a abandonar seu domínio e a declarar inimizade contra a iniqüidade, com diversos ataques, tendo como objetivo colocar em suas consciências, divergências entre eles e Deus, para que eles não descansem e repousem nas seguras promessas de Deus. E para conseguir isto, ele usa e inventa vários argumentos. Algumas vezes ele chama à lembrança deles, os pecados de sua juventude ou aqueles que cometeram no tempo de cegueira. Freqüentemente ele objeta a ingratidão deles em relação a Deus e suas presentes imperfeições. Através de doença, pobreza, tribulações nos seus lares, ou pela perseguição, ele pode alegar que Deus está zangado e não liga para eles. Ou pela cruz espiritual, que poucos sentem e menos ainda entendem sua utilidade e proveito, ele poderia levar os filhos de Deus ao desespero e, através de infinitos meios mais, ele anda ao redor como um leão que ruge, para minar e destruir nossa fé.

Mas é impossível para ele prevalecer contra nós, a menos que nós, obstinadamente, nos recusemos a usar a proteção e a arma que Deus tem oferecido.

Os eleitos de Deus não podem recusá-la, mas buscar pelo seu Defensor quando a batalha estiver mais acirrada, pois os soluços, gemidos e lamentações de tal luta (vencer o medo, as súplicas por persistência), são a busca incontestável e certa de Cristo nosso campeão. Não recusamos a arma, embora algumas vezes, por debilidade, não a usemos como devêssemos. É suficiente que seus corações sinceramente clamem por forca maior, por persistência e pelo livramento final de Cristo Jesus.

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