quarta-feira, 26 de março de 2008

Incompetência homicida - No ano passado, dengue já havia matado mais do que acidente da Gol

Por Reinaldo Azevedo

O ministro José Gomes Temporão está fazendo de conta que a dengue é um problema que se agravou drasticamente em 2008, como se tivéssemos experimentado, em 2007, o paraíso. Será? Só se for para o mosquito. O Jornal Nacional informou nesta terça — e são dados oficiais do próprio Ministério da Saúde: morreram no ano passado, de dengue, em todo o país, 158 pessoas. Isto mesmo: 158! Nada menos de 61 das vítimas fatais eram crianças. Quatro pessoas a mais do que matou o acidente da Gol, que, por justos motivos, tanto constrangeu e chocou o país.

O que uma coisa tem a ver com a outra? Gosto pelo escândalo? Não! Apenas chamo a atenção para uma tragédia pela qual só choraram os familiares das vítimas, que não consternou o país. Os dados estavam mais ou menos difusos. O ministro José Gomes Temporão e seus cabelos mais negros do que as asas da graúna apareciam tão serelepes querendo fazer plebiscito sobre o aborto e demonizando a Igreja Católica, que todos chegamos a pensar que ele já havia matado os mosquitos. Mas não. Pessoas é que haviam morrido.

Se eu fosse um desses petralhas vagabundos, diria qualquer coisa como: “É que só choramos as mortes de quem anda de avião; esquecemos o povo”. Mas eu não sou. A morte decorrente da incompetência oficial, no ar, na terra ou mar, deve ser sempre lastimada, sejam as vítimas pobres ou ricas.

Assim, a situação do Rio é, nada menos, do que uma tragédia anunciada. Ninguém podia alegar ignorância, muito menos o ministro Temporão. Fora de controle a doença já estava. Agora, a situação se extremou.

É claro que os casos ocorridos no Rio acabam tendo mais visibilidade. Por razões óbvias, a mídia também está mais presente, não é? E então assistimos à mobilização de emergência — necessária, sim, mas também prova de um desempenho melancólico do Ministério da Saúde. Prefeitura e governo do Estado têm a sua cota de responsabilidade. Mas a coordenação desse trabalho sempre foi da Saúde. A causa das mortes, como quase sempre quando as vítimas se contam em várias dezenas, é a omissão do poder público. Incompetência mata.

O resto é firula para tentar transferir o ônus da tragédia.

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