terça-feira, 19 de dezembro de 2006

Missão e Responsabilidade Social: A igreja cidadã

“O povo está passando fome”, dizia uma faixa carregada por uma multidão que protestava. Os estatísticos da ONU prevêem, para os próximos anos, a morte de milhares de pessoas por subnutrição. Por outro lado, as doenças do coração alcançam hoje o maior índice de causa de mortalidade. É uma das suas principais causas é o comer em excesso e a vida sedentária.
Milhares de crianças morrem porque as mães, subnutridas, não tem condições para amamentá-las, e nem os pais, dinheiro para comprar leite. Curiosamente, nunca houve tanto dinheiro e tanto progresso no mundo.
Quanta contradição! Quanta injustiça social!
Que diria e o que faria o Senhor Jesus diante deste quadro? Posso imagina-lo sentado no monte, diante de uma multidão que enfrentava problemas semelhantes ou até piores que os nossos: a opressão do Império Romano, governadores cruéis e sanguinários, como o rei Herodes, espoliação contínua do povo por classes privilegiadas.
A miséria é algo muito triste! É desolador ver seres humanos com fome, sem Ter com que se alimentar! A miséria material é uma desgraça!
A nossa grande dificuldade está em não entendermos a nossa missão. Perdemos a consciência da razão pela qual existimos.
Seguindo esta ênfase eclesiológica sob cunho escriturístico vemos que Ekklesia, Igreja, é um termo composto e que pode ser dividido em "Ek" (para fora de “sair”) e "Klesia", que vem de "Kaleo” (chamar). Etimologicamente pode, portanto, ser entendida como "chamada para fora de", o que a princípio nos dá uma idéia mais real da comunidade dos santos que entra em um templo, mas que precisa postar seus olhos para além dos muros. Obviamente o termo também está ligado a "agrupamento de indivíduos", e de certa forma a "instituição igreja ou assembléia”, porém em todo o N.T. adquire o conceito de "comunidade dos santos".
A perda da identidade cristã em busca do ser e do ter, tem feito muitas vítimas espirituais. Daí é fácil diagnosticar a igreja evangélica brasileira, a partir da nossa visão de reino, que é comprometida com outros valores e princípios que não são bíblicos, mas passageiros e decepcionantes.

É preciso criar métodos que alcancem lugares, que até então estavam limitados para a nossa presença

Eu entendo a missão de um modo diferente. Eu entendo a missão de forma completo como: não somente cuidar do espiritual da pessoa, pois muitas vezes esquecemos que o ser humano não é formado só do espiritual, ele é composto por seu lado cognitivo, ou seja, seu lado mental, é composto também por seu lado afetivo, ele preciso de amor, de carinho de afeto e aí vem o lado espiritual. É necessário lembrar de como Jesus trabalhou na evangelização da mulher samaritana. Ele não ficou preso ao espiritual, aquela mulher tinha pecados, mas ela tinha vários problemas emocionais e afetivos. Ela era desprezada e humilhada. Ela ia tirar água do poço no horário em que ninguém ia tirar, mas Jesus está lá e inicia uma conversa com a mulher e a conduz para um assunto mais próximo, fazendo com que ela abra seu coração e a partir desse ponto entra com a mensagem da salvação, revelando em primeira mão para aquela mulher que ele era o Messias [João 4:1-26].
A proposta é que se pense numa missão que assuma como “missão integral” que trabalha em todas as áreas da vida do ser humano.
Missões não é um programa eclesiástico, é a respiração da Igreja. Lembro que na tribo Konkomba, no oeste africano, há uma expressão que diz: “respiração é vida – não é preciso pensar para respirar; não é preciso pensar para viver”.
Com a implantação da Igreja Presbiteriana no Brasil, na fase inicial, a igreja nascente era um movimento de pessoas, sem muita estruturação; na segunda fase, a mais intencionalmente planejada e deliberada, igrejas foram organizadas e instituições sólidas foram criadas para evangelização indireta, como no caso das escolas e serviços médicos – “Ao lado de cada igreja, uma escola, uma clínica e ambulatórios médicos”.
Evangelização, educação e ação social – a base para este slogan – [Mateus 4:23; 9:35-38].
Alguém já disse: “Se encontramos uma pessoa com fome e lhe damos um peixe, matamos a sua forme naquele dia; mas se a ensinamos a pescar, teremos resolvido o problema dela”. Como ensinar o homem a Ter conhecimento para “pescar” e alcançar uma vida abundante?
É criando estes recursos. A igreja deve se comprometer em criar meios de crescimento intelectual, profissional e educativo em todas as áreas. Através de oficinas, galpões de cursos profissionalizantes. Se a igreja não se preocupar com o homem no seu todo, ela estará cometendo um erro, e deixando o ser humano incompleto nas suas necessidades, pois ela não só precisa do espiritual, mas também de algo que o estimule, a ter uma vida que o faz feliz por completo, tendo a vida eterna, mas tendo uma paz ao dormir, que quando acordar vai ter um bom café da manha e um emprego a sua espera.

A visão e o propósito de Deus são mais amplos; estendem-se além das paredes da igreja e alcançam todas as pessoas que estão ao nosso redor

O que a igreja deve promover, é uma capacitação profissional para que a comunidade onde ela está inserida se sinta estimulada na realização de seus sonhos, planos e alvos de vida e mais, e criar neles um vislumbramento de que há espaços e oportunidades para que as pessoas inseridas na comunidade façam a diferença e marquem a história de que houve pessoas que ali acreditaram e lutaram por uma vida melhor, mais igualitária, justa e estável.
Gosto muito da dinâmica de Cristo. Ele é sábio e inteligente na ação de expressar seus sentimentos e atos de amor para com as pessoas. É simplesmente fantástico o “jeitão” peculiar de Jesus – [Mateus 14:13-21]. A reação de Jesus, diante da presença da multidão no lugar que Ele havia reservado para descansar, foi inusitada. Ao invés de zangar-se, de dispensá-la para poder desfrutar do merecido descanso, Jesus compadece-se dela. A compaixão de Jesus é ativa, pois o leva a assumir-se como resposta às necessidades da multidão:
· Cura todos os enfermos [Mt. 14.14];
· Ministra-lhes o seu ensino com suas palavras de esperança [Mc 6.34];
· Mata a sua fome. É interessante notar que esse milagre acontece numa situação de extremos: de um lado uma enorme multidão, que somente de homens havia cerca de 5.000, de outro, a escassez de recursos - apenas 5 pães e dois peixes.

Sem uma dose de sacrifício não conseguiremos alcançar a nossa missão. As pessoas tem o seu próprio ritmo, quem quiser alcançá-la tem de se adaptar. Não dá para manter nossas tradições e agenda, é necessário mudanças. É preciso assumir a dinâmica e o dinamismo da cidade se a quisermos alcança-la para Jesus.
Deve entender o processo de fome, que marca o relacionamento da cidade com os seus habitantes: gente que veio para a cidade em busca de alimento; de espaço social; de realização dos sonhos mais secretos. Gente que, hoje, além da fome que não foi mitigada, sofre da neurose da solidão, da competição, da falta de identidade e do medo; etc.
Portanto, a igreja, precisa tornar-se um lugar de refúgio para o morador da cidade. Um lugar onde ele encontre comunidade, cooperação, identidade e segurança.
A igreja precisa ver-se como fonte de cura. Isso implica em desenvolver uma comunidade terapêutica; em ter possibilidade de exercer o poder curador e sobrenatural do Espírito Santo; em ter programas de assistência na área de saúde, usando bem os seus médicos, dentistas e enfermeiros.
O dever da igreja é envolver-se com os famintos, os excluídos da cidade, precisa ver-se como resposta de Deus para eles. A igreja que deseja impactar a cidade, deve gerar programa de desenvolvimento comunitário; de assistência aos moradores de rua, às crianças de rua, porém, não de forma paternalista. A ação social da igreja não deve gerar dependência sócio-econômica das pessoas, e sim, emancipação.
É de extremo dever a igreja se fazer como resposta à fé em Deus, com gratidão, lançando mão de seus recursos, independentemente da quantidade destes. Crendo, portanto, que Deus os multiplicará, tornando-se, consequentemente, cooperadora de Deus na multiplicação dos recursos utilizados.
Algo que a igreja não pode jamais tornar-se, é um movimento de massas, onde pessoas entram e saem sem serem reconhecidas. O alvo da igreja é a humanização da cidade. Uma multidão não precisa ser um ajuntamento amorfo, um empurra-empurra em uma competição pelo pão. Uma multidão pode ser um ajuntamento de comunidades - de grupos de pessoas que, juntas, compartilham do pão, isto é, de grupos de companheiros. A cidade também pode ser assim. Por isso a igreja deve envolver-se na criação de centros comunitários; na promoção de eventos que levem gente a conhecer gente. A igreja precisa ser agente de humanização da cidade, assim os homens verão as nossas boas obras e glorificarão ao nosso Pai, que está nos céus [Mt 5.16].

Bob Pierce (estabeleceu a Visão Mundial e a Bolsa do Samaritano) – “Que o meu coração seja quebrantado pelas coisas que quebrantam o coração de Deus


Conclusão:

Sendo assim, a igreja deve criar e implantar um “Trabalho Social de Restauração da dignidade humana e Valorização da vida” em que sejam implantados projetos articulados entre si com o objetivo primeiro a construção ética e social que desenvolva ações que promovam ou façam emergir as potencialidades para o relacionamento com a sociedade criando uma nova perspectiva de vida e como objetivo secundário encaminha-los com uma nova visão de mundo no exercer de suas potencialidades.

Fica evidente que é necessário...
a) Reajustar o grau do nosso amor;
b) Reajustar o grau da nossa convicção de missão;
c) Reajustar o grau do nosso chamado por Deus.

O mundo ainda há de ver o que Deus pode fazer com, por e através de um homem que for inteiramente consagrado a ele

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